Não é novidade que vivemos em uma era com infinitas possibilidades de escolha em diversas áreas – do supermercado que oferecem dezenas de variedades de um mesmo produto, centenas de modelos de smartphones/celulares e uma diversidade incrível de trabalho. Porém, as pessoas sentem-se cada dia mais pressionadas, perdidas e infelizes com a sensação de estarem “perdendo oportunidades”.
“O psicólogo Barry Schwartz mira em um dos dogmas centrais da sociedade ocidental: liberdade de escolha. Schwartz estima que a escolha nos tornou menos livres e mais paralisados, mais insatisfeitos em vez de mais felizes.” Fonte: TED
Neste palestra, ele propõe reflexões profundas sobre dilemas que as pessoas enfrentam e critica valores tidos como “bons” como a liberdade de escolha e a conectividade.
Referências
- http://www.fgordillo.com/2010/04/27/the-paradox-of-choice-and-mobile-apps-part-i/
- http://eduardomrlopes.blogspot.com.br/2011_12_01_archive.html
- http://www.ted.com/talks/barry_schwartz_on_the_paradox_of_choice.html
- http://companhiadepapel.blogspot.com.br/2012/08/mes-de-julho-o-paradoxo-da-escolha.html
Transcrição da palestra
Vou comentar algumas coisas do meu livro que eu espero reforçarão outras coisas que vocês já ouviram, fazendo algumas conexões, caso passem despercebidas. Quero começar com o que eu chamo de “dogma oficial”. O dogma oficial do quê? O dogma oficial das sociedades industriais ocidentais. E o dogma oficial diz o seguinte: se quisermos maximizar o bem-estar dos nossos cidadãos, o caminho é maximizar as liberdades individuais. A razão para isso é que a liberdade é inerentemente boa, valiosa, compensadora, essencial para sermos humanos. E porque se as pessoas tiverem liberdade, então cada um de nós pode agir por conta própria e fazer aquilo que maximiza nosso bem-estar, e ninguém tem que decidir por nós. O jeito de maximizar a liberdade é maximizar as opções de escolha.
Quanto mais escolhas as pessoas têm, mais liberdade elas têm, e quanto mais liberdade elas têm, maior o bem estar-bem.
Eu acho que isso está tão incorporado na sociedade que ninguém pensa em questionar.Está também profundamente incorporado nas nossas vidas. Alguns exemplos do que o progresso moderno tornou possível. Esse é o meu supermercado. Não é muito grande. Só uma palavra sobre molhos para salada. 175 molhos de salada no meu supermercado, sem contar os 10 tipos de azeite de oliva extra-virgem e os 12 vinagres balsâmicos disponíveispara você fazer uma grande variedade de seus próprios molhos, caso nenhum dos 175 que a loja oferece seja do seu gosto. O supermercado é desse jeito. E então você vai até a loja de eletrônicos para comprar um aparelho de som — caixas, CD player, cassete, rádio, amplificador. Nessa loja de eletrônicos sozinha, existe esse número de aparelhos de som.Nós podemos montar 6,5 milhões de aparelhos de som diferentes usando os componentes oferecidos em uma loja.
Você tem que admitir que são muitas escolhas. Em outras áreas — o mundo das comunicações. Existia um tempo, quando eu era menino, que você podia ter o tipo de telefone que quisesse, contanto que fosse da Ma Bell. Você alugava o telefone. Não comprava. Uma consequência disso, por sinal, é que o telefone nunca quebrava. Esses dias acabaram. Agora nós temos uma variedade quase ilimitada de telefones,especialmente no mundo dos celulares. Esses são os celulares do futuro. Meu favorito é o do meio — MP3 player, aparador de pelos e maçarico para creme brûlée. E caso você não tenha visto esse modelo nas lojas, pode dormir sossegado que um dia verá. Isso faz com que as pessoas entrem nas lojas fazendo essa pergunta. E sabe qual é a resposta para essa pergunta? A resposta é “Não.” Não é possível comprar um celular que não faça muita coisa.
Em outros aspectos da vida muito mais importantes que o consumo, acontece a mesma explosão de escolhas. Saúde — não ocorre mais nos EUA de você ir ao médico, e o médico dizer o que fazer. Em vez disso, você vai ao médico, e ele diz: a gente pode fazer A ou pode fazer B. “A” tem esses benefícios e esses riscos. “B” tem esses benefícios e esses riscos. O que você quer fazer? E você diz, “Doutor, o que eu devo fazer?” E ele diz, “A” tem esses benefícios e riscos, e “B” tem esses benefícios e riscos. O que você quer fazer? E você diz, “Se você fosse eu, Doutor, o que você faria?” E o médico diz. “Mas eu não sou você.” E o resultado é o que a gente chama de “autonomia do paciente,” o que parece uma coisa boa. Mas na verdade é uma transferência da responsabilidade de decisão de alguém que sabe alguma coisa — o médico — para alguém que não sabe nada, pode estar doente e não está na melhor condição de tomar decisões — o paciente.
Existem grandes campanhas publicitárias de remédios voltadas para pessoas como você e eu, o que, se formos pensar, não faz nenhum sentido, já que não podemos comprar esses remédios. Por que eles querem nos vender se não podemos comprar? A resposta é que eles esperam que a gente ligue para o médico no dia seguinte e peça para que a receita seja mudada. Uma coisa dramática como a própria identidade agora virou uma questão de escolha, como mostra esse slide. Nós não herdamos uma identidade, nós a inventamos. E a gente pode se reinventar quantas vezes quiser. Isso significa que todo dia ao acordar de manhã, você tem que decidir que tipo de pessoa quer ser. Com respeito a casamento e família, existia um tempo em que a perspectiva de quase todo mundo era de se casar o mais cedo possível, para ter filhos o mais cedo possível. A única escolha real era “quem”,não “quando”, e não o que se fazia depois.
Hoje em dia, tudo está em aberto. Eu dou aula pra estudantes inteligentes, e passo 20% menos tarefas do que passava. Não é porque eles são menos espertos, e não é porque eles são menos aplicados. É porque eles estão preocupados, se perguntando, “Devo me casar ou não? Devo me casar agora? Devo me casar depois? Devo priorizar filhos ou carreira?” Todas essas são questões exaustivas. E eles vão responder essas perguntas,mesmo que signifique deixar algumas tarefas de lado e não ganhar uma nota boa na minha aula. E eles devem mesmo. Essas são questões importantes. Trabalho — somos abençoados, como o Carl disse, com a tecnologia que nos permite trabalhar cada minuto de cada dia em qualquer lugar do planeta — com exceção do Hotel Randolph.
(Risos)
Tem um canto, por sinal, que eu não vou contar pra ninguém, que o WiFi funciona. Não vou contar porque eu quero usar. Isso significa, essa incrível liberdade de escolha com respeito ao trabalho, que temos que nos decidir, uma vez atrás da outra, sobre se devemos ou não estar trabalhando. Se formos ver nosso filho jogar futebol, temos o celular num lado da cintura, o Blackberry do outro lado, e o laptop, provavelmente, no colo. Mesmo que estejam desligados, cada minuto que olhamos nosso filho jogar mal, também nos perguntamos,”Devo atender essa ligação? Responder esse e-mail? Rascunhar essa carta?” Mesmo que a resposta seja “não”, certamente vai fazer a experiência de assistir a partida muito diferente do que teria sido. Em qualquer lugar que olhamos, coisas grandes e pequenas, materiais e comportamentais, a vida é uma questão de escolha. O mundo de antes tinha essa cara. Ou seja, tinha algumas escolhas, mas nem tudo era questão de escolha. O mundo de hoje tem essa cara. A questão é: isso é uma boa ou má notícia? A resposta é sim.
(Risos)
Todos nós sabemos o que tem de bom, então vou falar sobre o que tem de ruim. Toda essa escolha tem dois efeitos, dois efeitos negativos nas pessoas. Um efeito, paradoxalmente, é que produz paralisia, em vez de liberdade. Com tantas opções para escolher, as pessoas acham muito difícil se decidir. Vou dar um exemplo dramático disso, um estudo feito sobre planos de aposentadoria voluntária. Uma colega minha teve acesso aos registros de investimento da Vanguard, a gigante dos fundos mútuos, referentes a um milhão de empregados e cerca de duas mil empresas diferentes. O que ela descobriu foi que para cada 10 fundos de aposentadoria que o empregador oferecia, a taxa de participação caía 2%. Oferecidos 50 fundos, 10% menos empregados participam do que se forem oferecidos cinco. Por quê? Porque com 50 fundos para escolher, é tão difícil escolher um fundo, que você acaba adiando para amanhã. E então amanhã, e depois de amanhã, e depois de depois de amanhã, e claro que o amanhã nunca chega. É bom entender que isso não somente significa que as pessoas vão ter que comer comida de cachorro quando se aposentarem porque não terão dinheiro na poupança, também significa que tomar uma decisão é tão difícil que eles perdem a chance de ganhar mais dinheiro. Por não participar, eles estão perdendo até cinco mil dólares por ano vindos do empregador, que alegremente investiria. Paralisia é uma consequência de ter muitas escolhas. Eu acho que isso faz o mundo ter essa cara.
(Risos)
Você quer acertar se for pra toda eternidade, certo? Não quer errar o plano de aposentadoria ou até o molho de salada. Esse é um efeito. O segundo efeito é que mesmo quando conseguimos superar a paralisia e tomar uma decisão, acabamos menos satisfeitos com o resultado da escolha, do que se tivéssemos menos opções pra escolher.Existem várias razões para isso. Uma delas é que tendo vários molhos de salada para escolher, se você compra um que não é perfeito — e que molho é? — é fácil imaginar uma escolha diferente que seria melhor. Acaba acontecendo que essa alternativa imaginada induz ao arrependimento da escolha tomada, e o arrependimento diminui a satisfação obtida com a decisão tomada, mesmo que seja uma boa decisão. Quanto mais opções, mais fácil de se arrepender com qualquer coisa decepcionante na escolha.
Segundo, vem o que os economistas chamam de custo de oportunidade. Dan Gilbert comentou hoje pela manhã sobre como o valor que damos as coisas depende da comparação que fazemos. Quando existem várias alternativas a considerar, é fácil imaginar os recursos atraentes das alternativas rejeitadas que deixam você menos satisfeito com a alternativa escolhida. Por exemplo. Vocês que não são de Nova Iorque, me desculpem.
(Risos)
Pensem no seguinte: Um casal está nos Hamptons. Mansões caríssimas. Lindas praias. Belo dia. Ninguém ao redor. O que poderia ser melhor? “Droga!”, esse cara tá pensando, “É agosto. Todo mundo no meu bairro está viajando. Eu poderia estacionar na frente do meu prédio.” E ele passa duas semanas remoendo a idéia de que está perdendo a oportunidade de estacionar na melhor vaga. O custo de oportunidade diminui a satisfação da escolha,mesmo quando ela é sensacional. E quanto mais opções para considerar, mais os recursos atraentes dessas opções vão ser vistos por nós como custos de oportunidade.Outro exemplo. Essa charge ilustra várias coisas. Fala sobre viver no momento, e provavelmente sobre fazer as coisas devagar. Mas um ponto importante é que quando você faz uma escolha, está escolhendo não fazer outras coisas. E essas outras coisas podem ter várias características atraentes, que vão tornar menos atraente o que você está fazendo.
Terceiro: aumento das expectativas. Me dei conta disso quando fui comprar uma calça jeans. Eu uso jeans quase o tempo todo. Existia um tempo que os jeans eram só de um tipo, você os comprava, eles ficavam horríveis, eram incrivelmente desconfortáveis, e se você os usasse e lavasse bastante, eles começavam a ficar bons. Eu fui comprar um jeans novo depois de anos usando um velho, e disse: “Eu quero uma calça jeans, aqui tá o meu tamanho.” E o vendedor disse, “Você quer colada, justa ou solta? Você quer braguilha com zíper ou botão? Lavada com pedras ou ácido? Você quer amaciada? Você quer com a boca larga ou justa? Blá, blá, blá…” E continuou. Meu queixo caiu. Depois de me recuperar eu disse: “Eu quero o tipo que costumava ser o único tipo.”
(Risos)
Ele não tinha idéia do que era, então fiquei uma hora experimentando todos os jeans, e saí da loja — verdade seja dita — com os melhores jeans que eu já tive. Eu comprei melhor. E foi toda essa escolha que me permitiu comprar melhor. Mas me senti pior. Por quê? Eu escrevi um livro pra tentar explicar isso pra mim mesmo. A razão por que eu me senti pior é que, com todas aquelas opções, as minhas expectativas sobre o que é uma boa calça jeans subiram. Eu tinha expectativas muito baixas. Eu não tinha expectativa nenhuma quando tinha um modelo só. Quando tem 100 modelos, droga, um deles tinha que ser perfeito. E o que eu comprei era bom, mas não era perfeito. Eu comparei o que eu comprei com o que eu esperava, e o que eu comprei era decepcionante comparado com o que eu esperava. Adicionar opções à vida das pessoas inevitavelmente aumenta as expectativas que elas têm sobre a qualidade dessas opções. E o que isso vai produzir é menos satisfação com os resultados, mesmo quando eles são bons. Ninguém no mundo do marketing sabe disso. Porque se eles soubessem, vocês não saberiam do que isso se trata. A verdade é mais assim.
(Risos)
A razão pela qual tudo era melhor quando tudo era pior, é que quando tudo era pior, havia a possibilidade das pessoas terem uma surpresa agradável. Hoje em dia, no mundo em que vivemos — nós opulentos, cidadãos industrializados, com expectativas perfeitas — o melhor que podemos esperar é que as coisas sejam tão boas quanto esperamos. Você nunca terá uma surpresa agradável porque suas expectativas, minhas expectativas, são muito altas. O segredo da felicidade — é pra isso que vocês vieram — o segredo da felicidade é ter baixas expectativas.
(Risos)
(Aplausos)
Quero dizer — só um momentinho autobiográfico — que eu sou casado com uma mulher e ela é maravilhosa. Eu não poderia estar melhor. Não me acomodei. Mas se acomodar não é sempre uma coisa ruim. Finalmente, uma consequência de comprar uma calça jeans ruim quando só existe um modelo para comprar é que quando você fica insatisfeito, e se pergunta por que, quem é o responsável, a resposta é clara. O mundo é responsável. O que você poderia ter feito? Quando existem centenas de calças jeans disponíveis, e você compra uma que é decepcionante, e você pergunta por que, quem é o responsável? É igualmente claro que a resposta é você. Você poderia ter escolhido melhor. Com cem calças jeans na vitrine, não existe desculpa para o fracasso. E então quando as pessoas tomam uma decisão, mesmo que os resultados da decisão sejam bons, elas se sentem frustradas, culpando a si mesmas.
A depressão explodiu no mundo industrial na última geração. Eu acredito que uma significativa — não única, mas uma significativa parcela dessa explosão de casos de depressão, e também suicídio, vêm das pessoas terem experiências frustrantes porque têm padrões muito altos. E quando elas tentam entender essas experiências, culpam a si mesmas. E o resultado objetivo é que nos damos melhor em geral, mas nos sentimos pior.Vamos relembrar. Esse é o dogma oficial, o que todos pensamos ser verdade, e é mentira. Não é verdade. Não há dúvida que alguma escolha é melhor que nenhuma, mas não significa que mais escolha é melhor que alguma escolha. Existe um número mágico. Eu não sei qual é. Estou confiante que passamos faz tempo o número em que mais opções melhoram o bem-estar.
Agora, como política — estou quase acabando — como questão de política, uma questão a se pensar é essa. O que permite toda essa escolha nas sociedades industriais é a riqueza material. Existem diversos lugares no mundo, e já ouvimos falar de vários deles, que o problema não é ter muitas opções de escolha. O problema é ter muito poucas. O que estou falando é um problema peculiar das modernas, opulentas, sociedades ocidentais. O que é tão frustrante e enfurecedor é o seguinte: Steve Levitt falou ontem sobre como essesassentos de bebê caros e difíceis de instalar não funcionam. É jogar dinheiro fora. Estou querendo dizer é que essas escolhas caras, complicadas — não é que elas apenas não ajudam. Elas na realidade prejudicam. Elas fazem a gente ficar pior.
Se algumas coisas da nossa sociedade que possibilitam toda essa escolha fossem transferidas para sociedades onde há poucas opções, não apenas a vida deles melhoraria,mas a nossa também. Isso é o que os economistas chamam de melhoria de Pareto.Redistribuição de renda beneficia a todos — não só os pobres — porque toda essa escolha excessiva nos aflige. Para concluir. Você deve ler essa charge, e, sendo uma pessoa sofisticada, dizer, “O peixe não sabe de nada. Nada é possível nesse aquário.” Imaginação pobre, visão míope do mundo — e é assim que eu vi a primeira vez. Mas quanto mais eu pensei, mais me dei conta que o peixe sabe de alguma coisa. Porque a verdade é que se você quebrar o aquário para tudo ser possível, você não produz liberdade. Você produz paralisia. Se você quebrar esse aquário para tudo ser possível, você diminui a satisfação.Você aumenta a paralisia e diminui a satisfação. Todo mundo precisa de um aquário. Esse é quase certamente limitado demais — talvez até para o peixe, certamente para nós. Mas a ausência de um aquário metafórico é uma receita para a miséria, e eu suspeito que para o desastre. Muito obrigado.
Excelente palestra, leve e gostosa de ouvir para dormir refletindo.
Ola,
Tenho intersee em adquir um exemplar do livro “O Paradoxo da Escolha”
Olá Camilo,
Sugiro pesquisar na internet, apenas escrevi o post.
Abraços,
Marcio